A importância dos rituais fúnebres

by 22 Abr 2023Luto

“Foi um funeral muito bonito”, partilham connosco muitas vezes as famílias. Agradecem-nos. Comovem-se e comovem-nos ao dizê-lo.

Mas o que significa isso: o que é um funeral bonito? 

Um funeral bonito é aquele que é povoado, onde, por meio de abraços e lágrimas, se recebem pesares e se somam flores, às vezes músicas, às vezes palavras tremidas declamadas por alguém emocionado. 

Um funeral bonito é onde se pergunta o que podem fazer às pessoas pelas pessoas mais próximas de quem morreu e se valida essa vivência de pesar. 

Um funeral bonito é onde se partilham estórias de quem morreu e onde se pára para escutar com curiosidade e afecto. É o cuidado, todo o cuidado. A celebração da vida e o amparo da saudade.

É bonito porque acolhe, porque conforta e revela o quanto aquela pessoa que morreu era querida, estimada e honrada ou quanto os familiares e amigos o são. É bonito porque dá ombro, colo e mão no momento de maior vulnerabilidade. E permite que nos despeçamos de nossos mortos com uma oração conjunta, um beijo ou coroando sua última morada.

Para além da tristeza, são bonitos os funerais porque o são por demasia importantes.

São importantes por inaugurarem o início do processo de enlutamento público. Permitindo que o luto seja afirmado e, por conseguinte, validado. Possibilitam a elaboração da perda, ao serem um espaço e tempo, organizador da vivência. Uma espécie de linha divisória entre o que era antes e o que virá depois.

Os rituais fúnebres divergem de acordo com a cultura, religião ou ausência de religião, os desejos da família, os desejos expressos pela pessoa que morreu e as circunstâncias em que as mortes ocorrem. Neles incluem-se as cerimónias e homenagens de despedida, o tratamento do corpo, o velório, as missas, o enterro ou a cremação. Apesar dos rituais diferirem nos seus significados de acordo com as crenças pessoais, familiares e sociais, também têm significados partilhados. O mais importante: o de facilitar a estruturar cognitiva da perda à pessoa enlutada num momento de entorpecimento, tristeza, choque e confusão característicos da fase inicial do luto.

Assim, desde organizar a cerimónia, preparar o corpo, comunicar a perda e a data e local das cerimónias a pessoas queridas, ler o edital até ao momento em que podem juntas reunir-se e compartilhar a sua dor, lembrar e conhecer novas estórias da pessoa que morreu, narrar a história da perda, ser compassiva e prestativa à dor do outro, despedir-se da pessoa amada, manifestar as condolências, confortar os mais frágeis, rezar pela alma de quem partiu: tudo ajuda a acomodar a notícia e as emoções. Todos nos beneficiamos desses rituais – do círculo mais próximo ao mais afastado. A verdade é que experienciar um funeral bonito é entrar com pé direito no luto. Um funeral bonito é um factor protector de um luto sadio. Imaginava-o?

Conte-nos: Qual foi o funeral mais bonito a que foi?

Psicóloga e hipnoterapeuta clínica e de saúde, especializada em processos de perda e luto, perinatalidade e parentalidade positiva. Ajuda miúdos, graúdos e famílias a conjugar sem lutas o verbo morreste-me, a restaurar o vínculo com quem já não está, a aguarelar a dor e a serem os guardiões da memória de quem lhes morreu.⁣⁣⁣

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