Todos os adolescentes são imortais – têm quilómetros e quilómetros de futuro pela frente e sede de estrada. A adolescência é o momento em que se fazem as malas e se planeia a viagem de uma vida com os amigos substituindo os pais como companheiros. Perder alguém na adolescência tira poder ao adolescente e quilómetros à estrada. Sabota a viagem.
Viver um luto na adolescência é devastador.
É contranatura aos adolescentes saberem-se mortais, buscarem as pernas dos pais, perceberem-se cautelosos, silenciarem as suas dores só para não destoarem do grupo, assumirem-se responsáveis pelo bem-estar da família, modelarem os seus mortos ao invés dos artistas da sua geração, conterem-se para não perder o controlo, sentirem-se sós, anestesiados, vulneráveis.
Em luto, é-se um adolescente em marcha-a-ré.
É que no luto muito se sente e os adolescentes tudo sentem. Severamente. Mas obrigam-se a disfarçar.
Buscam reinvenção constante na tentativa de encontrarem uma versão sua onde a realidade encaixe.
Fingem calmaria numa quietude agitada. Por fora baías, por dentro tempestades.
Às vezes, o contrário: por fora uns tsunamis, por dentro uns desertos.
Ninguém sabe do adolescente e o adolescente não sabe de si. É difícil acompanhar. Não é criança, nem adulto, é uma fronteira indefinida. Regride a modelos de processamento de fases anteriores por serem conhecidos e antecipa-se em comportamentos que ainda não lhe cabem na tentativa de encontrar fugas, casacos que sirvam ou soluções.
Está perdido e só. Profundamente só.
A terapia é via de regra o lugar seguro do adolescente. O lugar a salvo dos olhares família e dos amigos que tanto tenta preservar. Esse lugar onde lhe é permitido experimentar ser esse que ainda não sabe que é, desarmar a sua dor com questões, desmoronar e reconstruir o seu mundo para que não lhe falte estrada, vida longa e curiosidade para a percorrer.